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Entrevista Fabio Meira, roteirista e diretor de AS DUAS IRENES

O premiado primeiro filme está em cartaz no circuito nacional de salas


 Em 2011, você já tinha uma versão do roteiro de DUAS IRENES escrita – qual?  E, antes disso, de onde vem a ideia e o desejo da história?

A ideia vem de um rumor familiar que escutei aos treze anos, que meu avô teria duas filhas com o mesmo nome, uma delas fora do casamento. Fiquei com isso na cabeça. Quinze anos depois, em 2008, fui convidado para um curso com Gabriel García Márquez, o “Como contar un cuento”, que ele dava todos os anos na Escola de Cinema de Cuba, por sorte estive no último. Entre conversas essa lembrança me atravessou a cabeça como um raio e decidi escrever um roteiro para um filme.

A primeira versão do roteiro foi escrita durante uma bolsa em Barcelona, no primeiro semestre de 2009. Em 2011, no Laboratório Novas Histórias, acredito que estávamos na versão 5 ou 6.

  1. O que o Gabriel Garcia Marques tem a ver com essa história de duas meninas do interior?

Estar perto dele por uma semana foi muito especial, é um artista que admiro muito, acho que todos os participantes estavam em estado de graça. Escutá-lo contar do seu processo me influenciou, em especial duas de suas opiniões: a de que o cinema não comporta os diálogos facilmente, não é como em um livro que damos entonação e sentido para eles, no cinema o diálogo choca com a imagem, deve ser muito bem pensado e estruturado, quanto menos se diz, melhor; o segundo foi acerca dos finais, acompanhamos um personagem por tanto tempo, por tantas peripécias, sofremos e rimos com ele, por isso para ele os finais devem ser sempre explosivos, devemos compensar o leitor/ espectador com algo que possa viver nele por bastante tempo. Como esquecer o final de “Cem anos de solidão” ou de “O amor nos tempos de cólera”?


Como se deu o processo de desenvolvimento do roteiro? Quantos tratamentos?

O processo foi longo, no total foram 6 anos, filmamos a 13ª versão. O Laboratório Novas Histórias foi o mais importante nesse processo, ali entre conversas entendi melhor o filme que queria fazer e como estruturá-lo melhor. Com um dos consultores, o colombiano Maurício Bonnet, tomamos a decisão de eliminar as 20 primeiras páginas e agarrar a história já em movimento, foi um crescimento enorme para o roteiro.

Ao longo desse processo tive duas colaboradoras, as roteiristas Gabriella Mancini e Iana Cossoy Paro, foram minhas leitoras assíduas e me faziam devoluções com comentários e observações sobre cenas e personagens. Gabriella fez sugestões de diálogos, um de seus dons, alguns deles estão no filme e funcionam incrivelmente bem. Iana tem um domínio de estrutura muito profundo, sempre bom escutá-la. As duas foram muito importantes nesse processo.

  1. Seu primeiro filme, certo? O desejo de direção vem de quando?

Minha formação é em Fotografia, queria ser fotógrafo, era fã de Cartier-Bresson, Sebastião Salgado, Bob Wolfenson e Nan Goldin, entre outros. Em Goiânia, onde nasci, cheguei a trabalhar em uma locadora de vídeo, era cinéfilo, mas me parecia algo muito distante da minha realidade. Após conhecer realizadores de curtas metragens desmitifiquei a profissão e me mudei ao Rio de Janeiro em 2003 para estudar em uma faculdade coordenada pelo Ruy Guerra, com quem trabalho e convivo até hoje. No começo achei que seria Diretor de Fotografia, mas depois percebi que o que me interessava na fotografia fixa estava muito mais ligado à direção.

A formação como roteirista veio depois, até mesmo por necessidade, embora desde o início tenha sido estimulado ao ofício por professores que tive, como Paulo Halm. Hoje sou completamente apaixonado por dramaturgia e não consigo me imaginar sem escrever. Isso me dá também a oportunidade de aprender com os diretores com quem trabalho, agora por exemplo, tenho tido momentos de diversão e aprendizado com Karim Aïnouz e Marcelo Gomes.



E sobre os prêmios que recebeu?

Como sou diretor estreante em longas, prêmio é interessante para ajudar a criar repercussão. No fim das contas o que queremos é chegar a mais pessoas, que aquele esforço e dedicação da equipe por tanto tempo tenha uma recompensa. Ganhamos prêmios em Guadalajara (Filme de Estreia e Fotografia), em Milão (Melhor Filme pela Associação Aprile) e em Gramado foram quatro, Ator Coadjuvante para Marco Ricca, Direção de Arte para Fernanda Carlucci, Melhor Roteiro e o prêmio que mais gostei, por coroar o coletivo, Melhor Filme pelo Júri da Crítica. Sem esses prêmios talvez não tivéssemos tido uma estreia tão bonita.


Você considera o seu desafio ganho? Está totalmente satisfeito do filme que fez? Quais foram as maiores dificuldades? E no que você não deu conta? (hora de ser autocrítico;-) Ainda há o que crescer no segundo filme?

Sendo bem sincero, acho que conseguimos um grande resultado para as pouquíssimas condições que tínhamos. Filmamos com um terço do orçamento que precisávamos, íamos a pé para as locações, a Arte e o Figurino tinham um orçamento irrisório. Consegui armar uma equipe guerreira e apaixonada. Outra vez a importância do roteiro, essa equipe e esse elenco só decidiram mergulhar no projeto porque se encantaram com a força do roteiro. Eles não me conheciam, à exceção da Daniela Cajías, diretora de Fotografia e do Ruben Valdés, Diretor de som, que foram meus colegas em Cuba. Todos os outros entraram no filme porque se fascinaram com a história das duas Irenes.


prêmio de melhor roteiro no Festival de Gramado 2017 . foto de Edison Vara

Tenho a impressão de que levarei um par de anos para ser autocrítico, estou tão mergulhado no lançamento que é difícil ser crítico agora. Mas sei bem alguns erros que não cometeria novamente no próximo filme. Tenho aprendido muito com o processo, da escritura ao lançamento, quero fazer muita coisa diferente.


Quantos e quais os outros projetos engatilhados?

O próximo projeto está pronto, o roteiro está sendo escrito há quatro anos. Ganhei prêmio de desenvolvimento da Prefeitura de São Paulo em 2013 e fui selecionado para a Fundação Carolina em 2015, onde fiquei seis semanas trabalhando o roteiro com consultorias do Karim Aïnouz e do dramaturgo argentino Jorge Goldenberg. Só nos falta o financiamento, sempre a parte mais difícil. Chama-se “Tia Virgínia”, trata da relação de três irmãs de setenta anos, é um filme para grandes atrizes. Por enquanto continuo na seara familiar e percorrendo o universo feminino. O desafio agora será tratar de uma geração tão diferente à das Irenes.


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