por Tiago Cordeiro
Neste domingo (31/10), em meio às eleições municipais, e ainda sob o efeito de sua nomeação para a Academia Brasileira de Letras, nosso membro imortal, Geraldo Carneiro, respondeu algumas perguntas por email. Confira abaixo:
Qualquer roteirista sabe o que significa o “ponto de virada” em um filme ou numa série de TV. Se tornar imortal vai ser um “turning point” para você ou só mais uma cena?
Confesso que não sei. A imortalidade, no caso, é uma metáfora. No nível físico, pelo menos, continuo com as mesmas disfunções de todos os escritores: dores na coluna, insônia etc. Espero que, no plano metafísico, haja compensações. Mas é uma alegria e um privilégio conviver com escritores e intelectuais que admiro desde sempre.
Quando sua nomeação foi confirmada, se falou muito sobre sua carreira como escritor, letrista e poeta. Ao lembrar da sua faceta como roteirista, deram destaque para O Sorriso do Lagarto, que foi uma minissérie marcante da TV Globo nos anos 90, em um momento que o formato ainda era embrionário por aqui. O que você pode falar deste trabalho, que teve ainda a colaboração de Walter Negrão, um autor consagrado da TV?
Walter Negrão é um dos maiores dramaturgos da história da TV. Sabe tudo sobre a estrutura dramática, a construção de tramas e personagens. Foi uma delícia trabalhar em parceria com ele. Eu já havia trabalhado antes com Bráulio Pedroso, quando escrevemos em parceria a minissérie Tudo em Cima, para a TV Manchete. A experiência d’O Sorriso do Lagarto foi adorável.
Ainda sobre O Sorriso do Lagarto, foi baseada em um livro do também imortal João Ubaldo Ribeiro. Como foi o desafio de adaptar o texto de um autor tão importante e o que te ensinou sobre as adaptações literárias para o audiovisual?
O primeiro capítulo foi inventado por Roberto Talma, o diretor e idealizador do projeto. O Negrão fez a escaleta. Eu fui apenas encarregado de escrever os diálogos. João Ubaldo morava em Berlim e foi aconselhado por seu compadre Jorge Amado a não assistir. “Adaptação é sempre decepcionante”, garantiu Jorge. E Ubaldo procurou seguir à risca o conselho. Mas quando uma jornalista lhe disse que no primeiro capítulo havia uma personagem que não existia no livro, chamada Maria das Mercês, que morria assassinada, Ubaldo saltou alarmado, exclamando: “Mataram minha prima Mercezinha!” Apesar da morte de Mercezinha, no ano seguinte Ubaldo e eu ficamos amicíssimos e escrevemos diversos roteiros juntos para a televisão.
Você descreveria para a gente as diferenças no ato de escrever Literatura e Dramaturgia (para cinema e/ou TV)?
No meu caso, a dramaturgia quase sempre começa a partir de uma encomenda. A poesia só sai quando quer. Se bem que já recebi algumas encomendas poéticas, entre as quais o poema Manu Çaruê, ópera performática com música de meu parceiro Wagner Tiso, e a cantata Carnavais, com música de meu parceiro Francis Hime.
Você transita em praticamente tudo o que diz respeito à palavra: tradução, ensaio, prosa, roteiro… Como se manter sempre tão criativo e alimentar todas estas facetas, uma coisa ajuda a outra?
É verdade, uma coisa provoca a outra. Às vezes, no meio de um roteiro sai um poema, ou no meio de um poema surge a ideia de uma história.
Você faz roteiro há bastante tempo. Como vê a evolução da profissão de roteirista no Brasil?
É uma profissão difícil, mas a indústria percebe cada vez mais que, sem o amparo do roteiro, parafraseando meu amigo Cacá Diegues, bye-bye Brasil.
O público viu seu trabalho no remake de O Astro, que celebrou a telenovela brasileira. Após sua nomeação, quando veremos um novo roteiro seu na TV ou no cinema?
Foi uma alegria imensa escrever o remake d’O Astro, em parceria com o Alcides Nogueira. Tenho vários projetos em avaliação na TV Globo. Tomara que em breve alguns deles sejam realizados.
Geraldo Carneiro, mais novo membro da Academia Brasileira de Letras
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