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Economia Criativa para o desenvolvimento

A chamada Economia Criativa representa atualmente 8% do PIB global e cresce cerca de 10% ao ano, um ritmo superior aos de outros setores da economia mundial. Calcula-se que gerou U$1,3 trilhão de renda em 2000, e foi o foco da reestruturação industrial da Inglaterra e da cidade de Xangai, na China.

Como capitalizar os recursos criativos nos países em desenvolvimento para gerar riqueza econômica e desenvolvimento sustentável no Sul?

A pergunta foi a base das discussões do Fórum Internacional de Economia Criativa para o Desenvolvimento, que ocorreu entre os dias 26 e 29 de novembro, no Rio de Janeiro, como parte da programação do Fórum Cultural Mundial.

O encontro reuniu quase 40 especialistas mundiais no assunto em uma série de debates e oficinas, com organização da Unidade Especial de Cooperação Sul-Sul (SU-SSC), ligada ao Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas (PNUD).

Num primeiro momento, toda a movimentação em torno dessa questão pode dar a impressão de que o óbvio foi descoberto. Edna dos Santos, chefe do Programa de Indústrias Criativas da UNCTAD, afirmou que embora a criatividade sempre tenha existido, a novidade é a conscientização de seu impacto econômico.

Para ela, as indústrias criativas ampliam o escopo das indústrias culturais para além das artes e cultura, já que incluem também as atividades econômicas baseadas no conhecimento e que utilizam a criatividade como insumo primário para produzir produtos ou serviços comercializáveis com valor agregado.

Mas por que esse conceito vem sendo caracterizado por muitos como uma estratégia fundamental de desenvolvimento no século XXI para os países do sul? Pode haver nesse discurso um elemento de “salvação da pátria”, que estaria superdimensionando o potencial da Economia Criativa?

Alguns especialistas que debateram no Fórum apresentaram justificativas para a crença nesse conceito. “A Economia Criativa tem vínculos macro e micro com a economia como um todo, caracterizando sua dimensão estratégica.

Há uma necessidade de se repensar a economia global e a Economia Criativa é uma nova estratégia de desenvolvimento”, analisou Edna dos Santos, para quem esse conceito é capaz de criar empregos e divisas de exportação, gerar crescimento econômico e promover inclusão social, diversidade cultural e direitos humanos, entre outras coisas.

“Não teremos desenvolvimento econômico e tecnológico se não tivermos desenvolvimento cultural”, afirmou o ministro da Cultura Gilbetto Gil. Já Lala Deheinzelin, consultora especial da SU-SSC e vice-presidente do Instituto Pensarte, considera que a Economia Criativa apresenta um novo paradigma, já que fala de desenvolvimento e não apenas de crescimento econômico, além de centrar o foco na distribuição e no acesso, e não na produção.

Mas Sérgio Sá Leitão, assessor especial da presidência do BNDES ((Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social), afirmou que as fórmulas para desenvolver uma indústria cultural no Brasil precisam levar em conta nossas características de um país emergente, onde o planejamento aplicado em Xangai, por exemplo, não funcionaria.

Uma possível demonstração do potencial da Economia Criativa no Brasil está na economia do carnaval baiano, apresentada por Paulo Miguez, professor da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia. Os blocos, símbolos da festa, foram transformados em oportunidades de negócios, sem com isso perder a identidade cultural. Segundo dados da EMTURSA, em 2006 cerca de um milhão de turistas foram atraídos para o carnaval em Salvador e 201.356 empregos foram gerados (incluindo aqueles criados nos meses de preparação anteriores à festa). Mas ainda faltam estudos que possam avaliar o impacto econômico na Bahia.

Outro exemplo foi trazido por Ana Carla Fonseca Reis, consultora de Economia Criativa para a ONU e vice-presidente do Insttiuto Pensarte. O Festival Jazz&Blues em Guaramiranga (Fortaleza) mostra a importância da criação de canais alternativos de distribuição. Pesquisas realizadas pelo Sebrae-Ce constatam que a circulação de recursos financeiros nos quatro dias do festival (cerca de R$3 milhões) é equivalente a dez meses de arrecadação do município, com reflexos na absorção de mão de obra local e na cadeia produtiva.

Os desafios para os países em desenvolvimento

Os desafios apara se captar o potencial da Economia Criativa para o desenvolvimento não são poucos. Yudshishtir Raj Isar, presidente do Fórum Europeu para as Artes e o Patrimônio (EFAH/FEAP), apontou um deles: “Quais são os padrões de inovação entre os empreendedores culturais nessa área que já podem ser identificados?”.

Para Avril Joffe, consultora especial do governo de Gauteng, África do Sul, o desenvolvimento de pequenos empreendedores e de micro e pequenas empresas na área cultural é a chave para o fomento das indústrias criativas nos países em desenvolvimento. Ela considera que a Economia Criativa estimula a expansão dos pequenos negócios. Outra chave seriam as ações transversais entre os diferentes ministérios.

Mas esses empreendedores precisam ser capacitados para pensar a cultura enquanto economia, na opinião de Sá Leitão. Ele avaliou a necessidade de regulação para que as próprias indústrias culturais não esgotem suas fontes de riqueza, lembrando que elas se alimentam da diversidade cultural.

Francisco Simplício, coordenador do Programa de Economia Criativa da SU-SSC, disse que os fundos públicos são limitados e que ainda não há interesse suficiente do setor privado de investir nessa área. Um problema que se liga a outro apontado por Raj Isar: “A Economia Criativa ainda está sujeita a dados especulativos. As bases empíricas ainda são muito fracas”. Francisco lembrou que a América Latina e a África, juntas, representam menos de 4% do comércio mundial de produtos culturais.

O aproveitamento da imagem positiva da cultura brasileira no exterior como fonte geradora de oportunidades econômicas foi levantado por Ana Carla, enquanto Paulo Borges, diretor da São Paulo Fashion Week, apontou que um desafio para o país é centrar as exportações em inteligência, design e criatividade, e não em matérias-primas.

Propriedade intelectual

A questão foi tema de um simpósio específico, que tentou confrontar os prós e contras do atual modelo de direitos de propriedade intelectual, considerados centrais no debate sobre a Economia Criativa. Dois representantes da OMPI (Organização Mundial da Propriedade Intelectual) estiveram presentes: Dimiter Gantchev, diretor da divisão de indústrias criativas, e Richard Owens, diretor da divisão de copyright, e-commerce, tecnologia e gestão.

Em sua apresentação, Owens mostrou as vantagens que o copyright (que protege os direitos autorais) fornece aos seus criadores. Ele afirmou que o sistema “não é um modelo de negócios, mas uma ferramenta flexível para a distribuição de conteúdo e o crescimento das indústrias criativas”. Mas sua posição de que “criadores e usuários têm mais escolhas do que nunca” não pareceu encontrar concordância entre os demais debatedores.

“O sistema atual de propriedade intelectual está em xeque e em confronto com a realidade”, afirmou Sá Leitão. “Temos que induzir nossa indústria cultural a buscar um novo modelo, senão estaremos sempre atrás”. Garry Neil, diretor executivo da Rede Internacional pela Diversidade Cultural, disse que dentro do órgão há sérias divergências sobre as vantagens do copyright para a diversidade cultural.

“As remessas para o exterior a título de pagamento de royalties, relativos à propriedade intelectual, aumentaram de em torno de U$146 milhões em 1993, para cerca de U$1.6 bilhão em 2004”, revelou Gilberto Gil. “As políticas dos países desenvolvidos hoje se expressam pela propriedade intelectual”. Ele resumiu a posição do Brasil nessa questão: “Deve-se evitar nos tratados internacionais a imposição de novas camadas de proteção de propriedade, que muitas vezes vão se sobrepondo desnecessariamente, e sim, estimular e trabalhar controles via tecnologia, com instrumentos de flexibilização e novos marcos legal e regulatório”.

Ao ouvir as apresentações dos brasileiros sobre o modelo atual de propriedade intelectual como inibidor do crescimento dos países em desenvolvimento, Gantchev afirmou que a OMPI é apenas um fórum de discussões que precisa do consenso dos países membros para poder deliberar sobre as questões. Foi rebatido por Marcos Alves de Souza, coordenador geral substituto de Direito Autoral do Ministério da Cultura: “O secretariado realmente nao vota, mas queremos imparcialidade. Participamos das reuniões e vemos o que acontece”. Ele fez referência a algumas movimentações de bastidores pouco transparentes nas reuniões da OMPI e disse que não é o que se espera de um organismo multilateral.

Incentivo do governo brasileiro

Gil afirmou que o Estado brasileiro já está sensibilizado para a Economia Criativa, citando como exemplos os programas de financiamento do BNDES, o Prodec (Programa de Desenvolvimento da Economia da Cultura) e as parcerias com a APEX-Brasil. Mencionou também a parceria do MinC com o IBGE, que resultou na pesquisa “Sistema de informações e indicadores culturais”, lançada durante o Fórum Cultural Mundial.

Com resultados referentes a 2003, o estudo (www.ibge.gov.br) fornece um material de análise da área cultural no Brasil enquanto setor produtivo, e tenta demonstrar a dimensão econômica da cultura no país. Entre diversos outros dados, a pesquisa revela que naquele ano, as atividades culturais movimentaram uma receita líquida de R$156 bilhões, representando 7,9% da receita líquida total. E que o total de pessoas trabalhando na área cultural no Brasil seria de 3,7 milhões.

O ministro também falou sobre o Observatório Internacional de Economia Criativa, cuja inauguração havia sido divulgada para o meio deste ano, em Salvador. Gil informou que o projeto será lançado inicialmente como um website, visando criar uma rede de trocas de informações entre países, e que o MinC vem batalhando para abrigá-lo no Centro Internacional Celso Furtado de Políticas para o Desenvolvimento, localizado no Rio de Janeiro.

O BNDES criou um departamento de cultura em junho deste ano para estimular a Economia Criativa no país e fortalecer as empresas que atuam no setor, conforme apresentado em um workshop durante o Fórum. Linhas de financiamento capazes de avaliar os valores intangíveis dos empreendimentos culturais já estão em operação, e outras surgirão nos próximos meses. O Programa de Apoio à Cadeia Produtiva do Audiovisual (Procult) já está operando, atuando na produção, distribuição, exibição e infra-estrutura.

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